Sem poder anunciar ou promover seus produtos, a indústria do tabaco mira na glamourização do cigarro usando o cinema, especialmente nos filmes que podem ser assistidos por crianças e adolescentes. A denúcia é da Organização Mundial de Saúde (OMS), que deflagrou hoje uma nova ofensiva contra a indústria do tabaco com a divulgação do documento Smoke Free Movies: from evidence to action. A OMS pretende convencer os países a classificarem como inadequados para crianças e adolescentes, atualmente o público-alvo dos fabricantes, os filmes que exibem cigarro ou fumantes.
O relatório da OMS diz que, dos filmes que exibiram o uso de tabaco, 76% deles foram classificados como livres para jovens no Brasil. O índice é maior do que nos EUA, onde 62% dos filmes contendo tabaco foram liberados para a juventude. A relação entre cinema e o uso do cigarro por jovens é uma parte importante do relatório, que cita dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças norte-americano que apontou a exposição ao cigarro nas telas como responsável por seis milhões de novos jovens fumantes somente nos EUA. E pior: destes, cerca de 2 milhões morrerão de doenças ligadas ao uso do tabaco. As pesquisas realizadas nos Estados Unidos estimam que os personagens fumantes do cinema são diretamente responsáveis por 37% dos adolescentes que fumam.
A OMS acredita que a simples reclassificação etária dos filmes pode prevenir 1/5 das mortes relacionadas ao uso do tabaco. Os dados mais recentes, de 2014, mostram que 44% de todos filmes de Hollywood e 36% dos filmes classificados como adequados para crianças e jovens trazem personagens fumantes ou exibem cigarro. Mas em outros países, a situação é ainda pior. Nove em dez filmes feitos na Islândia e na Argentina contém cenas com cigarro, incluindo os classificados como adequados para crianças e adolescentes.
De acordo com o diretor do Department of Prevention of Noncommunicable Diseases da OMS, Dr. Douglas Bettcher, o cinema é um dos poucos canais para acessar a audiência sem nenhuma restrição. “As 180 nações que assinaram o tratado internacional Convenção-Quadro de Controle do Tabaco são obrigadas pela legislação internacional a banir propagandas, ações de promoção e pratrocínios feitas pela indústria do cigarro”, acrescenta. Desde 2003, a OMS alerta as autoridades de saúde para o uso dos filmes como estratégia para cativar crianças e adolescentes, tema do Dia Mundial Sem Tabaco daquele ano. Veja mais aqui.
O cigarro e o cinema
Mesmo pressionada nos últimos anos, a indústria do cinema tem resistido aos apelos de evitar o fumo nos filmes. Desde 2007, a Escola de Saúde de Harvard endossa a mudança da classificação etária dos filmes que exibem cigarro (confira o que falamos sobre isso na época aqui) como sendo adequada para pessoas maiores de 17 anos. A campanha, apoiada também pela OMS, contou com a participação de várias outras instituições como a Smoke Free Movies, ligada à Universidade de San Francisco, mas não conseguiu envolver a indústria do cinema. Semanalmente, a Smoke Free Movies lista no site os filmes em cartaz nas categorias com cigarro e sem cigarro, com as respectivas classificações indicativas.
Em 2008, a Smoke Free chegou a veicular um anúncio denunciando que 80% dos filmes que concorriam ao Oscar naquele ano tinham personagens fumando. Com esse tipo de estratégia, segundo a entidade, a indústria do tabaco consegue incrementar em US$ 4 bilhões as vendas. Leia mais aqui.