A economia da maconha

07/03/2016

Artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo em 7/3/2016

Por Ronaldo Lemos

Quer um argumento adicional para considerar uma mudança na atual política sobre drogas? Então vale analisar o impacto econômico da legalização da maconha. Por exemplo, o Estado do Colorado, nos Estados Unidos, não sabe o que fazer com tanto dinheiro.

Desde que legalizou a maconha para fins recreativos, o Estado tem vivido um ciclo de bonança econômica que levou o novo mercado a ser apelidado de “ouro verde”. A estimativa é que em 2015 as receitas com a maconha legalizada ficaram próximas a US$ 1 bilhão, enchendo os cofres públicos de impostos.

A nova indústria aumentou também o gasto dos turistas nas concorridas estações de esqui do estado (como Aspen). Na esteira do sucesso, foi criada uma Câmara de Comércio da Maconha, reunindo empresários locais. Há ao menos duas escolas para formação de administradores do ramo (a Marijuana Business Academy e o Cannabis Career Institute). Ao menos 10 mil empregos foram gerados.

É claro que questões de saúde pública (e seus custos) são fundamentais. No entanto, isso não impede que outros Estados como Arizona, Alaska, Oregon sigam passos similares. O debate pela legalização avança também em países como o Canadá e até na França.

Para além do sucesso na economia “tradicional”, a maconha está gerando uma onda de novas empresas de tecnologia. O Vale do Silício já está atuando fortemente no ramo. Um dos fundos na área é o MJIC (Marijuana Investment Corporation), especializado em investir em start-ups tecnológicas do setor. Aliás, opções de investimento não faltam. Há ao menos 66 empresas de maconha e tecnologia baseadas no Vale do Silício.

Uma das mais antigas é a Leafly, site que classifica “varietais” de maconha, atribuindo notas para cada um deles em termos de sabor, aroma e efeitos. Outro site, Marley Natural, é mantido pela família de Bob Marley em parceria com investidores. A ideia é se tornar a primeira empresa global de Cannabis, antecipando o movimento de liberalização.

Mais celebridades empreendem na área, como Willie Nelson ou Snoop Dogg. Há até uma empresa aceleradora chamada Gateway, que oferece mentoria, espaço de “coworking” e treinamento para empresas de tecnologia com produtos ou serviços relacionados a maconha.

Não deixa de ser irônico. Os países desenvolvidos que mais fomentaram a “guerra às drogas” estão armando o cenário para se tornarem os principais beneficiários da sua legalização. Estão fazendo isso pela fatia mais nobre do mercado, de alto valor agregado, com produtos altamente diferenciados, marcas globais e tecnologia em todos os elos da cadeia. Nada muito diferente do que aconteceu com outros produtos agrícolas, como o café.

Depois de importar o modelo da “guerra às drogas”, não seria surpresa que em um futuro próximo importássemos também Cannabis de alta qualidade “made in USA”, quando a liberalização finalmente chegar nestas bandas.