Ah, a felicidade… Tão sonhada, tão buscada, tão falada, tão abstrata, tão ilusória…
Podemos alcançar a sensação de felicidade de várias formas: alcançando um objetivo, vencendo uma competição, cooperando com os outros, estimulando nossos sentidos, participando de uma atividade artística, através da meditação, devoção, vícios ou pela força da imaginação. Mas, o que é, afinal, a tão louvada felicidade? Seria ela nossa razão de viver, nosso propósito? Uma motivação secreta para tudo o que fazemos? Quem sabe não encontramos a felicidade em uma atitude?
Talvez ela dependa muito menos de coisas exteriores do que imaginamos. Quem sabe, quem sabe, podemos atingi-la pelo treinamento sistemático de nossas mentes e corações? É possível que ela dependa muito menos dos acontecimentos objetivos do que das marés de nossas mentes.
Ah essa felicidade, tão efêmera! Tem em altura aquilo que lhe falta em comprimento. Sem tais altos e baixos a vida seria um tédio! Talvez estar sempre buscando a felicidade seja como tentar segurar água com as mãos, não dura. Quando parece que a temos, ela logo se esvai.
Quem sabe a felicidade não foi feita para ser buscada? Quem sabe ela só é alcançada se não for perseguida? Quem a busca incessantemente a alcança ou vive em uma ilusão? Talvez ela seja um bônus, algo que vem incidentalmente.
Talvez ela seja como a miragem no deserto.
Talvez ela seja um processo, não um fim, um rio que segue adiante. Não é sobre onde irá chegar, mas como se viaja.
Felicidade, talvez, não seja ter o que se quer, mas querer o que se tem. Quiçá podemos encontrá-la nos ocupando com coisas tidas como ‘pouco importantes’. Em um clarão de entendimento, num olhar de compaixão, naquela mensagem tão aguardada, no entendimento mútuo, no brilho do olhar partilhado, nos encontros inesperados.
A felicidade é constantemente ignorada porque não custa nada.
Quem sabe a felicidade não é o prazer sem arrependimentos? Ou boa saúde e memória ruim? Talvez venha da inocência de quem a sente, de captar muito no que é “pequeno”. Quem sabe ela não é o estado sereno, despreocupado e pacífico, do tolo entre os trapaceiros.
Talvez possamos encontrá-la sentados à beira-mar, em paz.
Talvez, mas só talvez, a felicidade possa ser encontrada no amor. O amor ao próximo, amor sem fronteiras, incondicional. Quem sabe precisamos aprender a nos amar antes de amar os outros. Talvez ela possa ser encontrada na atitude de sermos amados por aquilo que somos realmente, não por como nos mostramos ao mundo. Quiçá podemos encontrá-la junto àquela pessoa que saiba fazer de um pequeno instante um grande momento.
Talvez possamos encontrá-la junto a pessoas que nos renovem, critiquem e estimulem. Que nos ajudem a fazer brilhar o nosso ‘eu’. Aqueles com quem se pode conversar e amar. Não alguém que te mostre o caminho, alguém com quem se crie um novo caminho, que esteja ainda por ser descoberto.
Um acidente passageiro, não ouvir o bater das horas, aceitar as mudanças, uma imaginação fértil, um sorriso bonito, a tranquilidade.
Talvez, talvez, ela possa ser alcançada quando percebermos que o trabalho é para nós e não nós para o trabalho. Quando percebermos que a vida é para ser vivida e não para dar certo. Quando tivermos a claridade de perceber que a normalidade é uma ilusão estéril e que devemos ligar menos para o que os outros pensam de nós.
Quem sabe chegamos a ela se pararmos de poupar o peito, pararmos de poupar a vida por medo, orgulho ou culpa. Se percebermos que guardar ressentimentos é como tomar veneno e esperar que o outro morra. Quando entendermos que a hora do sim é o descuido do não. Quando não deixarmos nossos planos serem maiores e mais importantes do que nós mesmos.
Talvez possamos vê-la brevemente dentro de um oceano de individualidade e indiferença, na abstração em meio ao cotidiano, num sorriso dado de graça em um dia cinza, no raio de luz em um dia escuro.
Talvez ela apareça quando alguém não puder sequer esboçar um sorriso, mas outro chega e deixa-lhe o seu.
Quem passa a vida buscando vive uma linda ilusão por um minuto para depois ter uma saudade que dura a vida inteira. Devemos perceber que não é triste mudar de ideia e sim não ter ideias para mudar. Não vencemos todas as vezes que tentamos, mas perdemos todas as que deixamos de lutar.
Talvez encontremos a felicidade, talvez, quando percebermos que o pior mal é aquele com o qual nos acostumamos. Quando percebermos que o que move o mundo são as perguntas e não as respostas. Que o valor das coisas não está no tempo que duram, mas na intensidade em que acontecem. Que a beleza não é um atributo em si, ela está, sim, nos olhos de quem contempla.
Talvez felicidade seja tudo isso. Mas só talvez.
Texto de Vitor Medalla, integrante da equipe do CQM.